terça-feira, 24 de abril de 2018

O Exorcista


Dificilmente dá pra falar sobre O Exorcista (William Peter Blatty, 1971) sem apelar para tudo que já foi usado para descrevê-lo: Um clássico eterno do terror; a maior obra de horror do século XX; leitura obrigatória para os fãs não apenas da literatura do medo, mas para qualquer leitor… Tanto o livro quanto o filme homônimo de 1973, continuam a assombrar e apavorar pessoas pelo mundo todo com a simples menção do seu nome.

Eu particularmente tenho um carinho especial por esse livro, porque foi o primeiro livro desse gênero que ganhei, quando tinha nove anos. Sendo assim, vamos dar uma olhada mais demorada nesse livro clássico contemporâneo.
O livro começa com o Padre Lankester Merrin, o exorcista do título, participando de uma escavação arqueológica no Oriente Médio. O padre encontra um ídolo de Pazuzu, o demônio sumério que representa o vento sudoeste. Uma série de acontecimentos incomuns indica que um combate com o mal acontecerá em breve. Percebemos as nuances de seu caráter logo de inicio, um homem de fé, mas confrontado com a necessidade de seguir o exemplo de Cristo e amar ao próximo, seja ele quem for.



Pulamos para o outro lado do mundo e conhecemos Chris McNeil e sua filha Regan, que vivem em Washington, D.C. Chris é atriz de cinema e Regan, uma inteligente e adorável menina de 12 anos de idade. Sem dar muitas revelações do enredo, Regan adoece, seu comportamento começa a mudar drasticamente e um assassinato ocorre na casa onde as duas vivem. Acompanhamos a mãe e sua peregrinação atrás de vários especialistas médicos para descartar as causas prováveis para o comportamento incomum da filha: câncer no cérebro, esquizofrenia, raiva reprimida relativa à separação dos pais, etc etc etc.



O assassinato começa a ser investigado pelo Tenente Kinderman, um personagem interessantíssimo, mas que seria muito mais bem desenvolvido no próximo livro do mesmo autor, O Espírito do Mal (Legion, 1983).

A mãe acaba procurando a ajuda de um padre jesuíta, Damien Karras, um religioso em plena crise de fé. Após alguns contatos com Regan, começa um processo investigativo para afastar quaisquer indícios de que a possessão tenha, na verdade, causa fisiológicas ou psicológicas.

Por fim, quando as suspeitas de que há uma possessão acontecendo são confirmadas, o padre Merrin é chamado para o exorcismo, sendo o padre Karras designado para ser seu assistente.

 O mais interessante de tudo é que, apesar dos temas possessão, medo e horror terem sido fortemente vinculados ao livro, ao longo de sua leitura percebemos que ele se apresenta mais como uma obra que remete aos romances policiais, muito mais populares na época em que foi escrito. Os personagens do Padre Karras e do Detetive Kinderman conduzem investigações, cada um no seu espaço de atuação. Enquanto o padre Karras se ocupa mais e mais da investigação que obrigatoriamente antecede um possível ritual de exorcismo, o detetive, empenhado em resolver o assassinato, segue as pistas que acabam conduzindo para a casa da família de Regan.

William Peter Blaty (1928-2017) conseguiu criar um daqueles livros para serem lidos e relidos, sempre com a possibilidade de que uma nova nuance seja enxergada. Os personagens são bem construídos, possuem medos, desilusões, questionamentos, anseios e preocupações críveis. O autor consegue criar uma aura de mistério e suspense perfeita, que vai aumentando gradativamente conforme o confronto final se aproxima. Ao mesmo tempo certas cenas do cotidiano estão tão presentes na história que o horror se torna algo próximo e possível, porque se mescla ao mundo conhecemos.

Por fim, como já foi dito, sempre que se fala sobre essa obra a palavra “terror/horror/medo” pode saltar na cabeça de quem ouve. É indiscutível que a história mostra uma espiral de apreensão, medo e desespero que, como o Maelstrom de Edgar Allan Poe, arrasta todos os que estão ao seu alcance para o fundo. Entretanto “O Exorcista” é muito mais do que isso. Fala, entre outras coisas, sobre redenção e sacrifício de uma maneira inigualável.





Coluna publicada originalmente na Revista Litere-se em 03 de fevereiro de 2017.